Há pouco mais de uma semana, este jornal publicou a tragédia pessoal de um jovem de 27 anos que foi parar nas ruas após perder tudo em jogos e apostas pela internet. Uma história, mas não a única, diante da avalanche de sites e aplicativos dessa natureza que, chancelados por figuras públicas, de jogadores de futebol a influenciadores, vendem a ilusão de que é impossível perder dinheiro. E o pior: tudo ao alcance das mãos, nos celulares.
O Banco Central, ao divulgar dados de movimentações bancárias relacionadas às apostas esportivas na semana passada, provocou uma onda de indignação, com reações na cúpula de Brasília, que até então lidava com passividade com o problema. Afinal, não há como não se impressionar com as cifras: a autoridade monetária divulgou que 5 milhões de beneficiários do Bolsa Família enviaram, apenas por Pix, cerca de R$ 3 bilhões para as plataformas de apostas on-line, as chamadas bets. Isso somente em agosto passado.
Ora, um levantamento mais amplo feito recentemente pelo Itaú com toda a população brasileira também é assustador: entre junho de 2023 e junho de 2024, excluindo os valores recebidos por apostadores vitoriosos, os brasileiros gastaram R$ 68,2 bilhões em apostas on-line. É uma febre — ou uma pandemia, como melhor disse na sexta-feira (27) a ministra da Saúde, Nísia Trindade — que está afetando a saúde financeira das famílias brasileiras.
O presidente Lula, diante da repercussão, reagiu: “Estamos percebendo no Brasil o endividamento das pessoas mais pobres tentando ganhar dinheiro, fazendo aposta. É um problema que vamos ter que regular, senão daqui a pouco vamos ter cassino funcionando dentro da cozinha de cada casa”. Ele propôs medidas de controle sobre apostas esportivas e restrições ao uso do cartão do Bolsa Família nessas operações.
Na sexta-feira (27), o ministro da Fazenda Fernando Haddad entrou em campo para justificar a demora na regulamentação dos jogos e informou que o presidente já pediu providências de todos os ministérios envolvidos, Fazenda, Saúde, Desenvolvimento Social e Esporte. Nesta semana, deve ser divulgado um pacote de medidas para conter o problema.
É evidente que o governo federal tem que lidar com suas próprias demandas financeiras, mas a questão das bets não pode ser encarada estritamente pelo viés do aumento da arrecadação, com a regularização desses setores de jogos e apostas esportivas on-line. Lula convocou todos os ministérios relacionados ao tema porque é um problema multissetorial, da saúde pública à Justiça. Ora, estamos acompanhando neste momento o desenrolar de uma operação que investiga o uso dessas plataformas para a lavagem de dinheiro. Várias frentes são necessárias para que o tema seja cercado.
Mas é no convívio social, na vida em família, que o drama acaba sendo mais sentido. É fácil demais fazer uma aposta, não há barreiras físicas para a compulsão e o vício. Basta prestar um pouquinho de atenção ao redor para ver que muita gente está inserida nesse hábito de apostar, como um benefício a mais associado ao prazer de acompanhar uma partida de futebol. Um hábito que, sem que se perceba, pode virar um vício. Os sinais estão todos ao redor, não precisa nem mesmo apostar para a acertar a dimensão do problema. (Com informações de A Gazeta)
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