A sentença da juíza de primeira instância de Rosário, Karine Lopes de Castro, indeferindo mandado de segurança em que pedia a anulação da sessão ordinária do dia 17 de março, na Câmara de Bacabeira que aprovou, em primeiro turno, proposta que visa antecipar eleição da mesa diretora do dia 1º de janeiro de 2023 para o mês de abril, pode se transformar numa espécie de paradoxo – declaração contrária à opinião dominante ou a um princípio admitido como válido.
De acordo com as informações analisadas pelo titular do blog, nos 37 parágrafos da sentença redigidos por Karine Castro, apenas dois falavam sobre as provas apresentadas pelo impetrante [vereador Capitão Lucas] contra o impetrado [vereador Jefferson Calvet]: a que tratava dos indícios de irregularidades no ato do protocolo dos projetos e da negativa do pedido de vista formulado pelo parlamentar para suspender a tramitação da proposta por entender que não era de interesse público.
Voto do presidente da Câmara
O problema, entretanto, é que a juíza desprezou importantes provas requisitadas por ela para comprovar possíveis indícios de ilegalidades na apreciação da proposição. Uma delas, por exemplo, foi a Ata 004/2022 (ID 64330073, páginas 1 e 3), que comprova a aprovação da matéria, em primeira discussão, com ‘voto’ ilegal do próprio presidente da Câmara que contribuiu para que se chegasse aos 2/3 de votos exigidos.
Como já destacamos anteriormente, normalmente quem preside a sessão do Plenário é impedido de votar por uma regra do Regimento Interno da Câmara. A única hipótese é em caso de empate, quando o Chefe do Legislativo decide a questão. Embora tenha solicitado cópia da Ata para pautar seu entendimento jurídico, a magistrada nada tocou em sua decisão sobre a possibilidade do presidente da Casa explicitar ou não o voto em projetos que são deliberados no Parlamento.
O caso bacabeirense é semelhante à uma decisão proferida, no dia 24 de maio de 2021, pela própria magistrada, anulando sessão que resultou na cassação do prefeito de Rosário, Calvet Filho (PSC). Na época, o presidente da Câmara rosariense acabou votando para contribuir que se chegasse aos 2/3 de votos exigidos para a cassação e foi basicamente isso que motivou a relatora anular a cassação na justiça.
Falta de quórum foi outra omissão
Outra suposta irregularidade ignorada pelo judiciário foi em relação à leitura e encaminhamento do projeto para as comissões temáticas numa sessão extraordinária que não contava com quórum necessário.
Isso ficou claro, também, na manifestação (ID 64330069, página 2) que a própria defesa do impetrado apresentou, apontando que seis vereadores assinaram o livro de presença, mas somente cinco estiveram verdadeiramente em plenário. Ou seja, um número que inviabilizava a continuação dos trabalhos por falta de quórum. No entanto, mesmo sem número de vereadores suficiente, o chefe do Legislativo seguiu com a sessão e acabou encaminhando as matérias de seu interesse para as comissões.
Decisão vira paradoxo prejudicial
A doutrina jurídica já aponta para uma espécie de paradoxo judicial decisões como essas. Em artigo (Não se sabe se é despreparo do juiz ou desejo de prejudicar a parte embargante), publicado na Revista Consultor Jurídico, em 27 de agosto de 2019, o advogado José Rogério Cruz e Tucci, professor titular da Faculdade de Direito da USP e membro da Academia Brasileira de Letras Jurídicas, destaca que a omissão é decorrente da não apreciação de fundamento que poderia levar à dispositivo em sentido diverso.
O doutrinador também afirma, a propósito, que o diálogo entre os operadores do direito, inspirado no princípio da cooperação, tem procurado dirimir a maioria delas, em prol da expedita e segura prestação jurisdicional.
“Não obstante, a prática revela que há juízes – não muitos, é verdade – que, sem projetar as consequências de sua decisão, visam, de forma deliberada, a prejudicar a parte, e, com isso, acabam, a um só tempo, atingindo a responsabilidade profissional do advogado!”, esclarece Tucci.
Na opinião do jurista, aliado à possível falta de conhecimento técnico, tal comportamento chega a traçar, em regra, exegese esdrúxula e inconsistente do texto legal, que causa enorme dano à parte que simplesmente se valeu dos mecanismos processuais previstos no Código de Processo Civil para defesa de seu direito.
Sentença omissa gera insegurança
Após a publicação da sentença, os aliados de Jefferson correram para comemorar não apenas a decisão, mas, principalmente, a omissão que acabou lhe beneficiando no litigio jurídico. Resta saber quais serão as consequências jurídicas que o caso pode trazer aos processos que tramitam naquela jurisdição evolvendo, por exemplo, membros do Legislativo rosariense em contendas com o prefeito da cidade. Além disso, a situação também gera insegurança jurídica, mas esse é um assunto para nossa próxima abordagem.
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