Sem vice e com a ausência do governador Carlos Brandão, o Maranhão seguirá com governo interino ou abre-se um vazio político e administrativo?

Ao se ausentar do cargo, no dia 17 do mês passado, para se submeter a uma cirurgia de retirada de um cisto no rins em São Paulo, o governador Carlos Brandão (PSB) ativou o dispositivo da linha de sucessão no comando do Executivo maranhense, resultando na posse do presidente do Tribunal da Justiça do Maranhão (TJ/MA), desembargador Paulo Sérgio Velten Pereira, em 1º de junho, um dia depois da Assembleia Legislativa autorizar o afastamento do governador na forma do Artigo 62 da Constituição Estadual.

Constitucionalmente, em caso de vacância no governo (titular e vice), seria o presidente do Poder Legislativo o primeiro na ordem sucessória para assumir o mandato. No entanto, o deputado Othelino Neto (PCdoB) abriu mão da prerrogativa para se dedicar à disputa à reeleição no Palácio Manuel Beckman. Pela regra, se ele sentasse na cadeira de governador, só lhe restaria tentar disputar o mandato no Executivo. Com isso, ficaria impedido de lutar pela manutenção da vaga no Parlamento.

No próximo dia 17, completa trinta dias que Brandão deixou o Maranhão com destino à capital paulista para uma cirurgia de cisto renal. A viagem para tratar a enfermidade passou a ser abordada pela imprensa oficial como “algo simples”. Na época, ignorando as regras constitucionais, divulgaram um comunicado destacando que o chefe do Executivo não precisaria tirar licença e, diante da “simplicidade da cirurgia”, deveria despachar do próprio quarto do hospital, após o procedimento.

No entanto, a situação mudou e a estadia fora do território maranhense teve que ser ampliada. Para evitar contendas jurídicas, a saída foi pedir o afastamento do cargo que só foi autorizado, quase quinze dias depois, em 31 do mês passado – data em que, legalmente, passou a ser contada como prazo oficial.

O problema, entretanto, é que a ausência de quase 30 dias da função, começou a expor um debate jurídico sobre dupla vacância gerando, inclusive, algo inusitado no Estado: o Maranhão que estava sem vice, também segue sem governador podendo, pela primeira vez na história, entrar num verdadeiro caos político e administrativo.

 

Paulo Velten assumiu governo, mas não pode ficar por muito tempo no cargo. Se interinidade passar dos 30 dias, será necessário a convocação de novas eleições para a escolha de um novo representante.

O que diz a Constituição?

Embora o desembargador Paulo Sérgio Velten Pereira, tenha sido empossado como governador interino do Estado, uma das dúvidas em relação à sua interinidade é sobre o período de permanência do magistrado no comando do Executivo.

Como a Constituição prevê governo interino por 30 dias, o que se pergunta é o que ocorre no 31º dia? O governador segue interino ou abre-se um vazio político e administrativo?

Para algumas perguntas, o mandamento constitucional e a jurisprudência trazem as respostas. Na Constituição Federal, e replicada na Constituição estadual por força de simetria, estabelece que no 30º dia de vacância, a Assembleia se reunirá e escolherá o governador que irá terminar o mandato.

STF opina sobre o assunto

Como está fora do estado há quase trinta dias, Brandão deixou o cargo vago, e por isso vem sendo ocupado pelo desembargador que deveria comandar o TJ-MA. O rito, entretanto, não demonstra simpatia dos próprios tribunais superiores, conforme decisão do STF, tomada em 2006, na ADI 2.709/SE.

Como sintetizou, na época, a relatora, ministra Cármen Lúcia: “em momento algum, a Constituição diz que alguém pode ser governador ou vice sem ser eleito” (BRASIL, 2006, p. 267); ao contrário, determina que “todo o poder emana do povo, que o exerce por meio de representantes eleitos” (art. 1º, parágrafo único (BRASIL, [2021a])). De acordo com a magistrada, o substituto legal só poderia exercer o cargo interinamente no intervalo de tempo entre a confirmação da vacância e a posse do eleito, que eventualmente pode ser ele próprio.

Preocupação de Flávio Dino

Foi preocupado com essa situação periclitante, que o ex-governador Flávio Dino (PSB) passou a pressionar o presidente da Assembleia Legislativa, Othelino Neto (PCdoB) a retornar ao Maranhão. Ele, que foi juiz federal por 12 anos, sabia dos riscos que o grupo estava correndo com o Legislativo estadual sob o comando do vice-presidente da Mesa Diretora da Casa, deputado Glalbert Cutrim, que é aliado do senador Weverton Rocha (PDT).

Apesar de o ex-governador utilizar argumentos jurídicos para esclarecer dúvidas em relação ao caso, a pergunta que segue sem resposta é por quantos dias a dúvida sobre o estado de saúde do seu sucessor vai persistir?

Quanto tempo Brandão vai ficar afastado? Ele terá condições físicas de reassumir o cargo e enfrentar uma campanha à reeleição? A preocupação de Flávio Dino é com a saúde de Brandão ou com a sua eleição ao Senado que fica mais difícil sem a figura do governador?

Caso semelhante

Não é a primeira vez que um chefe de Executivo teve que ser afastado por impedimento devido aos problemas de saúde. Em 2019, o ex- prefeito de Paço do Lumiar, Domingos Dutra (PT), após complicações de saúde em decorrência do crescimento de um coágulo na cabeça, teve que ser internado às pressas no Hospital São Domingos, em São Luís.

Por conta da falta de comando no município, ocasionada pelo problema de saúde sofrido por Dutra, a Câmara de Vereadores deu posse à vice-prefeita Maria Paula Azevedo Desterro (SD), no cargo de prefeita. Dutra não retornou mais e Paula permaneceu até o fim do mandato em 2020, quando acabou sendo reeleita.

O caso ocorrido na cidade luminense é semelhante ao comando do Executivo maranhense com uma única diferença: no Palácio dos Leões já não existe mais a figura do vice-governador para atuar no “mandato-tampão” enquanto o titular busca condições de saúde para reassumir o cargo e enfrentar a campanha pela reeleição.

Veja o que diz a Constituição do Maranhão:

Parágrafo único, do Art. 62 – O Governador e o Vice-Governador não poderão, sem licença da Assembleia Legislativa, ausentar-se do país ou do Estado, por período superior a quinze dias.

Art. 31 – É da competência exclusiva da Assembleia Legislativa:

VII – conceder licença ao Governador para interromper o exercício de suas funções, bem como autorizá-lo e ao Vice-Governador a se ausentarem do Estado e do País quando a sua ausência exceder a quinze dias;

Art. 60 – Em casos de impedimento do Governador e do Vice-Governador do Estado, ou de vacância dos respectivos cargos, serão sucessivamente chamados ao exercício do Poder Executivo o Presidente da Assembleia Legislativa e o Presidente do Tribunal de Justiça.

Art. 61 – Vagando os cargos de Governador e de Vice-Governador do Estado, far-se-á eleição noventa dias depois de aberta a última vaga.

§ 1º – Ocorrendo a vacância nos dois últimos anos do período governamental, a eleição para ambos será feita trinta dias depois da última vaga, pela Assembleia Legislativa, por voto nominal.

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